Marvel marca presença no Oscar, mas não com o que você espera
A presença da Marvel no Oscar me fez pensar sobre o que realmente torna uma trilha sonora memorável, bora refletir comigo se essa escolha faz mesmo sentido.

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas divulgou recentemente a lista de pré-indicados ao Oscar, dando início oficial à corrida pelas estatuetas da próxima edição da premiação.
Como já era de se esperar, nomes de peso e produções aclamadas começaram a surgir entre as categorias técnicas e artísticas.
No meio dessa lista, porém, um título chamou atenção por motivos bem específicos: um filme da Marvel Studios apareceu entre os pré-indicados e, mesmo sem grandes expectativas em torno disso, a escolha ainda conseguiu surpreender — infelizmente, não de forma positiva.
Uma indicação inesperada e difícil de entender
A Marvel apareceu, sim, na pré-lista de indicados ao Oscar. No entanto, da forma mais surpreendente possível.
O projeto escolhido pelo estúdio para concorrer na categoria de Melhor Trilha Sonora foi Capitão América: Admirável Mundo Novo, uma decisão que, honestamente, deixou muita gente coçando a cabeça e se perguntando: por quê?
Não me entendam mal: eu gostei do filme. As cenas de ação são ótimas, super bem coreografadas e funcionam muito bem dentro da proposta.
O roteiro, por outro lado, me deixou levemente decepcionado. Ainda assim, nada disso é o ponto central aqui.
O problema é que, quando falamos de trilha sonora, Admirável Mundo Novo entrega exatamente o que se propõe a entregar, nem mais, nem menos. Ouça o tema principal do filme:
É uma trilha competente, funcional, que eleva algumas cenas emocionalmente, mas que não se destaca, não arrisca e tampouco deixa uma marca duradoura ou interessante.
E, convenhamos: em um ano em que a Marvel lançou Thunderbolts* e Quarteto Fantástico, essa escolha soa, no mínimo, muito esquisita.
Thunderbolts*: a ausência mais estranha de todas
Se existe uma trilha sonora da Marvel neste ano que parecia “feita para premiações”, essa trilha é a de Thunderbolts*.
Composta pelo trio, conhecido por seu estilo experimental, íntimo e emocionalmente profundo, a trilha do filme foi uma grata surpresa, inclusive para mim, que não esperava absolutamente nada do projeto.
Meu interesse só mudou quando descobri que os compositores seriam os mesmos de Tudo em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo, outro trabalho excepcional e profundamente sensível. E o resultado em Thunderbolts* não ficou atrás.
A trilha mergulha na melancolia dos personagens, especialmente na solidão da Yelena, e explora com muita inteligência a dicotomia do Bob: o conflito interno entre o Sentinela e o Vácuo. Ouça abaixo:
É música que conversa diretamente com o psicológico dos personagens, que acrescenta camadas e subtexto ao filme.
Poderia citar inúmeros outros exemplos aqui, mas pra encurtar o texto, deixo aqui algumas das minhas músicas favoritas:
- The Light Inside You Is Dim
- Walker’s Memory
- Penthouse Fight
- No Use Fighting
- The Attic
- Show Us The Worst
- Not Alone
- Thunderbolts* (Tema da Equipe)
Diante disso, a ausência de Thunderbolts* na corrida pelas indicações ao Oscar soa não apenas estranha, mas quase injustificável.
Quando a trilha faz falta e quando não
O que realmente torna uma trilha sonora importante vai além da imersão ou da qualidade técnica: é o impacto que a sua ausência causaria. Em outras palavras, uma boa trilha é aquela que faz falta quando não está ali.
Pense nas músicas citadas acima e nas cenas que elas acompanham. Agora, tente imaginar essas sequências com outra trilha sonora por cima. Em muitos casos, isso simplesmente não funciona. A identidade emocional da cena se perde.
Você consegue imaginar Star Wars com outra trilha sonora? Duna? Indiana Jones? Jurassic Park? Vingadores? Harry Potter?
Já em Capitão América: Admirável Mundo Novo, acontece o oposto. O filme funciona perfeitamente de forma independente da sua trilha sonora.
Ela cumpre seu papel, mas acrescenta pouco à narrativa, a ponto de poder ser facilmente substituída por outras músicas genéricas do próprio MCU sem grandes prejuízos.
Thunderbolts*, por outro lado, não sobrevive a esse exercício. Sem a trilha do Son Lux, o impacto emocional muda completamente.
O peso dos personagens não é o mesmo, as cenas perdem intensidade e nada permanece igual, justamente porque ali a música não está apenas preenchendo espaço, mas contando história junto com o filme.
Quarteto Fantástico: quando a trilha conta a história
Por outro lado, temos Quarteto Fantástico, assinado pelo igualmente fantástico Michael Giacchino, de quem, inclusive, já falamos aqui anteriormente.

Giacchino faz algo raro: ele conta a história do filme através da trilha sonora. É como se o roteiro narrasse uma parte, enquanto a música completasse o restante, adicionando subtexto, emoção e significado.
O tema do Quarteto Fantástico é absurdamente marcante. Daqueles que você escuta uma vez e passa o resto do dia cantarolando mentalmente. Ouça abaixo o tema do filme:
Tanto o vocal quanto o instrumental utilizam uma abordagem muito semelhante àquela que John Williams usou no clássico tema do Superman e isso quer dizer MUITA coisa.
Além disso, os temas do Galactus e da Surfista Prateada também são extremamente característicos, funcionam narrativamente e ajudam a definir os personagens sem precisar de uma única linha de diálogo. Ouça:
E ainda assim… Quarteto Fantástico também ficou de fora.
Então… por que Capitão América?
Diante desse cenário, a escolha de Capitão América: Admirável Mundo Novo como representante da Marvel na pré-lista do Oscar soa, no mínimo, confusa.
Não é uma trilha ruim. Longe disso. Mas é, sinceramente, a mais “fraca” entre os três projetos citados. Não inova, não arrisca e não se destaca dentro do próprio catálogo do estúdio.
O que torna tudo ainda mais curioso é justamente isso: quando a Marvel finalmente entrega trilhas sonoras mais autorais, ousadas e narrativamente ricas, elas acabam ignoradas em favor de algo seguro e protocolar.
E novamente, não entendam mal: não é como se houvesse rejeição ao personagem, nem tampouco como se o filme tivesse sido pouco popular a ponto de justificar essa estranheza.
O problema é outro. Dentro da própria trajetória do personagem, essa é, de longe, a trilha sonora que menos o representa.
Para efeito de comparação, basta lembrar da trilha de Falcão e o Soldado Invernal, composta por Henry Jackman. O mesmo Jackman que assinou Capitão América: O Soldado Invernal e Capitão América: Guerra Civil.
Ao avançar para a série, ele teve o cuidado de renovar a identidade musical do personagem, sem simplesmente reutilizar o tema clássico do Capitão América, e ainda assim manteve uma consistência sonora impressionante, que reforçava a imersão e o arco do Sam Wilson. Ouça:
Isso simplesmente não acontece em Capitão América: Admirável Mundo Novo.
Uma trilha que cumpre função, mas não constrói legado
E, ainda que essa ausência de identidade não fosse, por si só, um problema grave, a sensação que fica é bem clara: a trilha sonora do filme existe para preencher uma lacuna sonora, não para alimentar a narrativa com subtexto, nem para aprofundar emocionalmente os personagens ou a própria trama, que já chega fragilizada desde o roteiro.
Ela tampouco constrói suspense de forma memorável, nem adiciona camadas relevantes à experiência. No fim, a música está ali apenas para acompanhar as cenas, sem dialogar com a história ou deixar uma marca real.
Ela está ali para acompanhar cenas de ação, fingir ter ligação emocional com o personagem e apenas isso.
Tudo o que poderia ter sido…
O mais frustrante é que isso não é apenas inconsistente quando comparado aos outros filmes citados acima, mas também entra em choque direto com a própria trajetória do Sam Wilson até aqui.
Na série, ele já tinha um tema bem estabelecido e coerente, ainda que não fosse tão forte, mas que ajudava a sustentar sua jornada de transição e amadurecimento como Capitão América. Veja a cena e repare na música:
Além disso, agora que Sam Wilson ocupa oficialmente o manto do Capitão América — supostamente o grande farol de liderança do MCU —, era de se esperar uma trilha sonora à altura dessa responsabilidade.
Um personagem com esse peso narrativo merecia uma identidade musical que refletisse sua evolução, que dialogasse com tudo o que ele construiu até aqui e elevasse sua posição dentro do universo.
O que se vê, porém, é o oposto: em vez de uma progressão natural, a trilha soa como um retrocesso, ignorando o caminho percorrido e desperdiçando a chance de transformar a música em parte essencial da consolidação desse novo Capitão América.
Funciona tecnicamente, cumpre o papel básico, mas não dialoga com a história, não acrescenta camadas e não deixa legado.
E é justamente por isso que a escolha da Marvel soa tão difícil de defender quando colocada lado a lado com Thunderbolts* e Quarteto Fantástico.
Mas é isso aí, né…
Agora fica a pergunta: você também achou essa escolha estranha ou acha que Admirável Mundo Novo merecia essa chance? Conta pra gente nos comentários e segue acompanhando o Legado da Marvel pra mais análises e discussões como essa.